30.1.05

 

A Motivação para Votar e A Defesa da Democracia

O artigo de J. Pacheco Pereira de 5ª feira passada, no Público, que li de relance, fala numa ausência de motivação para votar no próximo dia 20 de Fevereiro, por parte de significativa quota de social-democratas: militantes, simpatizantes ou tradicionais eleitores do PSD, realidades nem sempre semelhantes, por vezes mesmo, bem diferentes, tão fluidas andam as delimitações dos enquadramentos ideológicos dos Partidos, nos nossos pós-modernos tempos.

Prova disso é a anunciada intenção de Freitas do Amaral em votar no PS, aconselhando com insistência os portugueses a fazê-lo, em artigo publicado na revista Visão, também da passada 5ª feira, dia 27-01-2005.

Não serei eu a criticá-lo, porque o voto é livre e ninguém pode ficar eternamente amarrado a uma presumida pertença ideológica uma vez afirmada, num dado contexto temporal e sociológico.

Há muito que passou o tempo do PREC e da Aliança Democrática e há muito também que caíram os regimes marcados por férrea orientação ideológica que geravam fidelidades e alinhamentos igualmente férreos por todo o mundo.

As diferenças desse tipo esbateram-se tanto que deixaram de ser importantes. Quase só por razões históricas elas se mantêm. Seria até conveniente provocar uma reformulação das doutrinas político-ideológicas, com o seu correspondente realinhamento partidário, como forma de desobscurecer os equivocados espíritos de alguns actuais dirigentes partidários.

No caso da declaração de Freitas do Amaral, pensarão muitos que se trate de uma inesperada inclinação esquerdista, após tantos anos de militância na Direita e no Centro-Direita.

Na verdade, Freitas do Amaral já há uns bons anos que se aproximara do Partido Socialista, na sequência da sua derrota nas eleições para a Presidência da República, em 1986, no confronto com Mário Soares, apesar do aparente paradoxo da ligação dos factos.

Esta inflexão de FA terá, porventura, sido estimulada pelo desentendimento ocorrido quanto à responsabilidade das contas da sua campanha eleitoral.

Sem dados bastantes para avaliar o conflito, parece-me que foram Cavaco Silva e o PSD os que agiram mal ao divorciarem-se dessa responsabilidade, deixando ao candidato derrotado, Freitas do Amaral, a incumbência de sozinho arcar com o pagamento das dívidas da campanha.

As solidariedades, quando se assumem, valem em todas as circunstâncias, no êxito ou no desaire. Este parece-me ser o princípio irrecusável.

Poucos anos depois, seria pela mão de Guterres, Primeiro-Ministro de Portugal, que Freitas do Amaral seria convidado para desempenhar o alto cargo de Presidente da Assembleia Geral da Nações Unidas, em Nova Iorque.

De então para cá, as ligações e as convergências de posições não cessaram de se reforçar, apenas perturbadas pela deserção de Guterres, em Dezembro de 2001, na sequência dos maus resultados eleitorais do PS nas eleições autárquicas.

Por momentos, Freitas do Amaral inclinou-se novamente para Durão Barroso e para o PSD, para logo depois recomeçar o seu percurso divergente, acentuado com a invasão do Iraque pelas forças armadas dos EUA, sem mandato da ONU, acção que Durão Barroso apoiou e Freitas do Amaral categoricamente condenou.

Para muita gente, não obstante, a aproximação do ex-líder do CDS aos Socialistas continua a parecer excessiva e contraditória com as posições que aquele durante tantos anos defendeu. Mas sem dúvida que a atitude é legítima e bem ponderada, porque Freitas do Amaral sempre foi uma pessoa que estuda muito bem as opções a tomar e suas implicações, sendo caracterizado como alguém que age de forma muito maduramente reflectida.

E, além do mais, quem sabe se não alimentará FA ainda uma leve esperança de vir a ser apoiado, nas próximas eleições presidenciais, de 2006, pelo Partido Socialista, caso a figura de Guterres, para tal desígnio, não se imponha ou ele venha a desistir de se apresentar como candidato, em definitiva opção por carreira política internacional ?

Quanto à relutância da família social-democrática em apoiar o PSD a 20 de Fevereiro, ela radica na fraca motivação que lhe deram, tanto Santana Lopes como Durão Barroso, à frente de Governos de pendor muito mais liberal que social-democrático, sempre com maior preocupação pelos défices orçamentais e pela competitividade das Empresas, do que por temas relacionados com a coesão social que estas deveriam também promover, como corolário da sua função social.

Acresce que a questão da Competitividade das Empresas aparece, no discurso de altos responsáveis do Governo e do PSD, por regra, encarada na sua visão mais redutora, quase só concentrada na diminuição de direitos e de proventos dos trabalhadores.

Deveriam antes antender a outros factores, esses sim, bem mais relevantes para essa desejada Competitividade, como sejam, a organização eficiente do trabalho, o aproveitamento dos recursos e aptidões existentes e não plenamente explorados, a formação profissional do corpo técnico das Empresas, a motivação dos trabalhadores, pela sua associação e participação nos objectivos previamente formulados e divulgados, uma maior equidade no estatuto remuneratório, prevenindo desnivelamentos exagerados, tudo coisas que, em geral, nunca são sequer mencionadas, muito menos praticadas, pelos habituais arautos do hiperbolizado conceito da Competitividade, a cujo cumprimento se acham, por regra, eximidos, remetendo para os mais fracos as nefastas consequências da sua quebra.

Esta prática constante dos Governos do PSD, agora coligado com os conservadores do Partido Popular, faz esmorecer o desejo e o sentido do voto dos social-democratas, que, no momento actual, se acham, na verdade, «desrepresentados» social e politicamente.

Seria certamente mais honesto e um factor de clarificação do universo mental em que se vive, se os dirigentes do PSD declarassem que deixaram de se inspirar no antigo modelo social-democrático europeu, visando hoje uma outra doutrina, se doutrina há, mais baseada na facilidade e no crescimento dos negócios, nos elevados salários e prémios dos Gestores, do que em qualquer forma de desenvolvimento económico criadora de equilíbrio social, que porventura até reputem nociva ou contraproducente para a livre florescência dos negócios.

De facto, parece ser esta a noção que os dirigentes do PSD deixam perceber aos seus tradicionais eleitores, compreensivelmente desmotivados para apoiarem uma prática governativa que ostensivamente os ignora nos objectivos que persegue.

Aliado a este problema de orientação doutrinária está o da fraca capacidade demonstrada pelos actuais dirigentes do PSD para desempenhar os altos cargos a que ascenderam.

Aqui chegados, muitos por processos nada recomendáveis e alguns mesmo deveras reprováveis, o seu desempenho revelou-se uma decepção, de uma mediocridade técnica surpreendente, nivelado pela baixa categoria ética de que emergiram, com a complacência, se não com a conivência, de altos e antigos dirigentes, alguns tidos como referências do Partido, coisa que profundamente os desacredita e lhes retira a autoridade de que se supõem investidos, para concitar os apoios e as adesões de que o PSD necessita, de forma vital nos períodos eleitorais e de forma substancial nos restantes.

E aqui entramos num caso muito lamentável, recentemente ocorrido no PSD, que foi o facto de este ter entregue a tarefa da elaboração do seu Programa de Governo a uma entidade exterior ao próprio partido, sob coordenação de alguém que nem vínculo lhe tem.

Se os Partidos já não se ocupam com a elaboração de um Programa de Governo, nem com a coerência da Doutrina que supostamente os orienta, nem com o escrúpulo ético dos seus candidatos a Deputados ou a outros cargos de nomeação política, é caso para se dizer então que a Política, como actividade digna e nobre, acabou para os cidadãos honrados, antes se tornou propriedade cativa de grupos de interesses e seus representantes, viciados nos jogos de intercâmbio de poder, de conspiração palaciana permanente, apenas motivados pelo acesso e manutenção do almejado Poder, neste caso esvaziado de sentido social, ético ou do que quer que seja que não implique directamente o exercício dos cobiçados lugares de mando.

Este ambiente, que actualmente já se encontra bem ilustrado no agitado e corrompido meio político-partidário português, se, num prazo que já não poderá ser longo, não for corrigido, erradicado, acabará por afastar grande parte dos seus melhores cidadãos e cada vez mais acentuará o seu carácter nocivo, gerando inexoravelmente a indiferença e o alheamento da Política justamente daquela parte de cidadãos ainda não moralmente degradados para o seu exercício.

Ficará assim preparado o terreno para qualquer aventura ou degenerescência política, desfechos pouco consentâneos com os ideais democráticos, tantas vezes proclamados e outras tantas pervertidos, pelos que se julgam ao abrigo das consequências da venalidade das acções que continua e ordinariamente têm praticado.

Quousque tandem ... e uma vez mais : Res non verba.

AV_Lisboa, 30 de Janeiro de 2005

Comments:
A responsabilidade pela elaboração do programa eleitoral do PSD foi entregue a António Mexia, que não é, de facto, militante do PSD. Na verdade, António Mexia não é mais do que um agente de um destacado banqueiro da nossa praça. Podemos assim antever que tipo de interesses terá sido privilegiado no programa eleitoral do PSD. Aquele conversa toda de Santana Lopes contra os bancos é apenas fumaça para desviar atenções, porque, no essencial, os negócios com este governo estão a correr de feição para os interesses desse banqueiro.

É uma vergonha que isto esteja a contecer no PSD, mas não vem de agora. Já Durão Barroso tinha dado a mão a António Mexia, por indicação do mesmo banqueiro, de quem Durão era já um solícito servidor. Santana não fez mais do que continuar a ligação, o que deve ter feito com relativa facilidade, pois ele e António Mexia são pessoas com evidentes afinidades.

Mas a coisa não se fica por aqui. O omnipresente banqueiro dispõe de fortes influências também dentro do PS. Aconteceu com Guterres e Pina Moura. Acontecerá agora com outros mercenários disponíveis no governo de Sócrates? Vamos ver.

É por tudo isto que nem sequer vale a pena votar. Desde há muito que o país está a ser dominado por forças que não vão a votos. Banqueiros, Maçonaria e Opus Dei, cada qual à sua maneira, controlam uns quantos fantoches dentro dos dois partidos que alternam no governo. É caso para os apelidar de políticos de alterne.

Assinado : Bricmont
 
A responsabilidade pela elaboração do programa eleitoral do PSD foi entregue a António Mexia, que não é, de facto, militante do PSD. Na verdade, António Mexia não é mais do que um agente de um destacado banqueiro da nossa praça. Podemos assim antever que tipo de interesses terá sido privilegiado no programa eleitoral do PSD. Aquele conversa toda de Santana Lopes contra os bancos é apenas fumaça para desviar atenções, porque, no essencial, os negócios com este governo estão a correr de feição para os interesses desse banqueiro.

É uma vergonha que isto esteja a contecer no PSD, mas não vem de agora. Já Durão Barroso tinha dado a mão a António Mexia, por indicação do mesmo banqueiro, de quem Durão era já um solícito servidor. Santana não fez mais do que continuar a ligação, o que deve ter feito com relativa facilidade, pois ele e António Mexia são pessoas com evidentes afinidades.

Mas a coisa não se fica por aqui. O omnipresente banqueiro dispõe de fortes influências também dentro do PS. Aconteceu com Guterres e Pina Moura. Acontecerá agora com outros mercenários disponíveis no governo de Sócrates? Vamos ver.

É por tudo isto que nem sequer vale a pena votar. Desde há muito que o país está a ser dominado por forças que não vão a votos. Banqueiros, Maçonaria e Opus Dei, cada qual à sua maneira, controlam uns quantos fantoches dentro dos dois partidos que alternam no governo. É caso para os apelidar de políticos de alterne.

Assinado : Bricmont
 
António, parece que era preciso passarmos por tudo isto que, ultimamente, tem acontecido, para que, colectivamente, 'acordásssemos' e nos déssemos conta do pântano que, insidiosamente, foi alastrando.
Se o baixo nível a que chegámos (e sinto que ainda vai em queda) servir para abanar consciências, então, no próximo dia 20, olharei para trás e direi que o passado recentíssimo foi o inferno, mas foi, também, o fogo da purificação.
Oxalá!
DespenteadaMental
 
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